24 de jun. de 2005

Junho

Duas velhinhas à varanda.
Cadeiras, cabelos, branquinhos, iguais.
Silêncio. Não falam.
São irmãzinhas.
Sobre a cidade se estende a tarde fria.
Tremulam úmidos sob seu manto os corpos, sem o hábito do sereno:
prédio, planta, gente, bicho.
Duas vizinhas à varanda.
Ocultas.
Conversam. Não falam
Aplacam o vazio.
Ausculto, deserta a sala, meu lunário perpétuo.
Velho homem que dança.
Mão e areia que canta.
Oratórios, pés ânsios.
Estou seca de vazio:
e nele, plena, repleta.
Pendo sobre o tempo,
na fresta que nele se abriu,
em que petrifica a poesia, em que se infiltra a poesia.
Pronto, é preso o instante.
Mesmo os carros, velozes.
Mesmo o ritmo do pássaro.
E as vozes, as pedras a ruir.
Já não se perde esta tarde.

(À Antônio Carlos Nóbrega)

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